20 resgatados de trabalho escravo em fazenda isolada de MT

Vinte trabalhadores foram resgatados de uma fazenda situada em Nova Maringá, a 392 km de Cuiabá, depois que auditores do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) constataram, na segunda-feira (15), condições análogas à escravidão no local. A equipe de fiscalização, apoiada pelo Ministério Público do Trabalho (MPT), Polícia Federal (PF), Defensoria Pública da União (DPU) e Projeto Ação Integrada (PAI), encontrou empregados sem registro, salários retidos, alojamentos insalubres e completo isolamento geográfico, quadro que configurou restrição de liberdade e violação de direitos fundamentais.
Dos 20 resgatados, 16 não possuíam contrato formal e recebiam somente por produção, sem garantia de salário mínimo ou jornada definida. Outros quatro até tinham carteira assinada, mas recebiam oficialmente apenas 30% da remuneração; os 70% restantes eram pagos “por fora” e também vinculados ao rendimento diário, prática que dribla encargos trabalhistas e esvazia a proteção legal. Nenhum dos empregados recebeu qualquer valor nos 25 dias que antecederam a operação, segundo depoimentos colhidos pela Auditoria Fiscal.
O isolamento foi apontado como fator decisivo para caracterizar o trabalho escravo contemporâneo. A propriedade está a 120 km da área urbana mais próxima, sem transporte público ou particular disponível. Sem dinheiro e sem meios para deixar a fazenda, os trabalhadores dependiam integralmente do empregador para alimentação, locomoção e água potável. A auditoria destacou que a impossibilidade prática de saída, mesmo a pedido, configura cerceamento de liberdade e subordina a mão de obra a condições degradantes.
Relatos gravados pela equipe de fiscalização mostram que o grupo sobrevivia com dieta baseada em açaí, mandioca e patuá, complementada eventualmente por peixes capturados em igarapés da região. A água para beber, cozinhar e higienizar era retirada diretamente do rio e o banheiro improvisado funcionava alguns metros adiante, às margens do mesmo curso d’água. Sem estrutura mínima, muitos preferiam dormir em redes armadas no mato para escapar do calor que se acumulava sob a lona utilizada como alojamento provisório.
Quatro empregados estavam confinados em um contêiner metálico sem ar-condicionado, camas, colchões ou armários. O espaço, descrito pelos auditores como “em total desordem e sem qualquer condição de higiene”, reunia roupas sujas, restos de alimentos e ferramentas de trabalho. O ambiente abafado, aliado à presença de insetos e à falta de ventilação, colocava em risco a saúde de todos que ali dormiam, sobretudo durante o período de estiagem, quando as temperaturas na região costumam ultrapassar 40 °C.
Concluído o resgate, os trabalhadores foram transportados pelo próprio empregador, sob supervisão da força-tarefa, até a zona urbana mais próxima para receber atendimento social e trabalhista. As verbas rescisórias calculadas pela Auditoria Fiscal somaram aproximadamente R$ 418 mil, valor que engloba salários atrasados, férias proporcionais, depósitos de FGTS e indenizações por dano moral individual. Paralelamente, o MPT propôs a assinatura de um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) para assegurar o cumprimento de obrigações legais e prevenir novas violações.
O caso também foi encaminhado às autoridades policiais para investigação de eventuais crimes de redução à condição análoga à de escravo, previstos no artigo 149 do Código Penal. Se ficar comprovada a responsabilização dos proprietários, as penas podem chegar a oito anos de reclusão, além de multas administrativas. As informações coletadas serão anexadas a inquérito que apura práticas de aliciamento, retenção de documentos e exposição a condições degradantes de trabalho.
Denúncias de trabalho análogo à escravidão podem ser feitas anonimamente pelo Sistema Ipê, plataforma eletrônica mantida pelo MTE. O denunciante deve fornecer o máximo de detalhes possível — endereço, nome do responsável, rotina de trabalho e indícios de irregularidade — para facilitar a checagem. Após o registro, a fiscalização analisa as informações e, se confirmada a suspeita, organiza diligência ao local, replicando o protocolo que resultou no resgate em Nova Maringá.
Crédito Foto: MTE / MPT
Fonte das informações: {source_name}