Itaú sob investigação: softwares rastreiam rotina de 1 mil demitidos

Itaú Unibanco demitiu mais de mil empregados remotos após monitorar, durante quatro meses, cada clique, site acessado e período de inatividade, abrindo uma crise que levou o Ministério Público do Trabalho a instaurar procedimento investigatório para apurar possíveis abusos na coleta de dados e eventual violação da Lei Geral de Proteção de Dados.

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A instituição admitiu ter analisado métricas como uso de mouse, teclado, videoconferências, mensagens internas e acessos ao pacote Office. Entretanto, negou capturas de tela, áudio ou vídeo. O episódio expôs a amplitude das plataformas de vigilância corporativa, destacando os softwares XOne e Teramind, capazes de exibir em tempo real a navegação do colaborador, gerar alertas automáticos e classificar comportamentos considerados fora da política interna.

Fundada em 2014, a Teramind afirma atender mais de 10 mil organizações em 125 países e disponibiliza em seu site uma demonstração com dados fictícios. No painel “live activity overview”, o gestor acompanha o que cada funcionário visualiza, identifica uso de guias anônimas e recebe avisos quando alguém envia e-mails com informações sensíveis ou pesquisa vagas de emprego. Há ainda recursos de geolocalização, ranqueamento por produtividade e gravação de vídeos de incidentes suspeitos.

Testes realizados pela BBC News Brasil confirmaram o alcance dessas funções. O suporte da companhia, porém, sustenta que a legalidade varia conforme a jurisdição e recomenda consulta jurídica local para adequação à LGPD. No Brasil, pelo menos dois processos trabalhistas de 2022 mencionam a Teramind no controle de jornada de vendedores de veículos em São Paulo. Os ex-funcionários alegam que a ferramenta registrava horários online, tempo ocioso e até conteúdo de ligações, argumentos anexados como prova de vínculo empregatício.

O XOne, desenvolvido pela Arctica em 2019, também foi colocado sob os holofotes depois que veículos de imprensa atribuíram seu uso ao Itaú, informação não confirmada nem negada pelas partes. A reportagem da BBC criou conta na plataforma, mas o acesso foi suspenso logo após a repercussão das demissões. Vídeos institucionais revelam menus que mostram sites visitados, duração de cada acesso, tempo de inatividade, aderência à jornada e rankings de quem menos cumpre o horário. O software também registra a posição geográfica dos computadores, reforçando o controle sobre equipes remotas.

A Arctica declara atender setores como finanças, telecomunicações e seguros, sem divulgar clientes. A empresa diz não gravar telas nem capturar conteúdo de comunicações pessoais, atribuindo ao empregador o dever de transparência com os colaboradores. Apesar dessa ressalva, relatos de trabalhadores do banco indicam ambiente de forte pressão: alguns afirmam levar o laptop até para pegar água, receosos de serem marcados como inativos e incluídos em futuras demissões.

Especialistas reiteram que o monitoramento não é proibido pela LGPD, mas requer base legal clara, consentimento informado e coleta proporcional. Para Pedro Henrique Santos, pesquisador da Data Privacy Brasil, a companhia deve demonstrar que não existe alternativa menos invasiva capaz de atingir o mesmo objetivo. “Quando decisões de RH se apoiam nesses dados, é crucial avaliar se realmente agregam valor ou apenas ampliam a vigilância”, alerta.

A dissertação de mestrado do pesquisador Fabrício Barili, na Unisinos, identificou que plataformas desse tipo tendem a intensificar a competição interna, pois transformam métricas de comportamento em comparativos de desempenho. No estudo, a Teramind é citada como solução focada em segurança da informação, não em produtividade; mesmo assim, suas funcionalidades permitem mapear cada etapa do trabalho diário.

Até o momento, o Itaú mantém a posição de que monitorou apenas softwares licenciados para uso corporativo. O banco não detalhou quais relatórios subsidiaram a dispensa dos mais de 1 000 empregados, tampouco forneceu demonstração prática do sistema ao MPT. O órgão, por sua vez, aguarda resposta oficial antes de decidir se abrirá inquérito civil ou ajuizará ação coletiva.

Enquanto isso, fabricantes de tecnologia avançam no refinamento dos algoritmos capazes de flagrar qualquer desvio, fortalecendo um mercado estimulado pela expansão do home office pós-pandemia. A polêmica envolvendo o Itaú sinaliza que, além de produtividade, está em jogo a proteção de dados pessoais dos trabalhadores e a definição de limites éticos para a vigilância digital no ambiente corporativo.

Foto: Getty Images via BBC

Fonte das informações: BBC News Brasil

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